Vídeos informativos sobre ciências forenses: um instrumento para melhorar a compreensão judicial da prova pericial
Palavras-chave:
prova pericial; validade ciências forenses; valoração da prova; comunicação da ciência forenseResumo
A crescente dependência da prova pericial nos processos penais tem evidenciado uma tensão entre a sofisticação técnica das ciências forenses e a limitada literacia científica dos julgadores. No entanto, a sofisticação técnica das ciências forenses nem sempre é acompanhada por uma capacidade equivalente dos julgadores para compreenderem e avaliarem criticamente os métodos e inferências que suportam esse tipo de prova. Estudos empíricos têm revelado que juízes e jurados atribuem frequentemente valor probatório elevado à prova pericial com base em sinais extrínsecos de autoridade — como a experiência declarada do perito, o seu estatuto institucional ou a confiança com que comunica — em vez de critérios técnicos de validade e confiabilidade. Este artigo analisa os limites de validade e confiabilidade de várias técnicas forenses atualmente utilizadas, destacando os riscos decorrentes da sua aplicação acrítica no foro penal. Partindo dessa constatação, este artigo propõe uma solução comunicacional inovadora: a utilização de vídeos informativos padronizados, apresentados previamente à produção da prova pericial, com o objetivo de promover uma compreensão mínima, mas crítica, por parte dos julgadores. Com base em estudos experimentais recentes demonstra-se que essa intervenção melhora a sensibilidade dos julgadores à robustez metodológica da prova forense, sem induzir ceticismo generalizado. A proposta revela-se especialmente pertinente no contexto português, em que persiste uma cultura de deferência acrítica ao discurso técnico dos peritos. Neste cenário, os vídeos informativos surgem como um instrumento pedagógico de baixo custo e elevado potencial epistémico, apto a reforçar a fundamentação racional das decisões judiciais e a promover uma justiça penal mais consciente e metodologicamente exigente.
Referências
Brandon L. Garrett; Peter J. Neufeld, “Invalid forensic science testimony and wrongful convictions”, in Virginia Law Review, vol. 95, n.º 1, 2009, pp. 1-97. Disponível online em https://www.jstor.org/stable/25470665 [consultado em 10/05/2025].
Brandon L. Garrett; William E. Crozier; Richard Grady, “Error rates, likelihood ratios, and jury evaluation of forensic evidence”, in Journal of Forensic Sciences, vol. 65, n.º 4, 2020, pp. 1199-1209. Disponível online em https://doi.org/10.1111/1556-4029.14323 [consultado em 10/05/2025].
Christophe Champod; Joëlle Vuille, “Scientific evidence in Europe: admissibility, evaluation and equality of arms”, in International Commentary on Evidence, vol. 9, n.º 1, 2011, pp. 1-69. Disponível online em https://core.ac.uk/download/pdf/85212846.pdf [consultado em 01/09/2021].
Carmen Vázquez, De la Prueba Científica a la Prueba Pericial, Madrid, Marcial Pons, 2015.
Carmen Vázquez, “Los retos de las pruebas periciales a partir del nuevo Código Nacional de Procedimientos Penales: apuntes desde la epistemología jurídica”, in Problema Anuario de Filosofía y Teoría del Derecho, n.º 11, 2017, pp. 341-378. Disponível online em https://www.scielo.org.mx/pdf/paftd/n11/2007-4387-paftd-11-341.pdf [consultado em 10/05/2025].
David H. Kaye et al., “Statistics in the jury box: how jurors respond to mitochondrial DNA match probabilities”, in Journal of Empirical Legal Studies, vol. 4, n.º 4, 2007, pp. 797-834. Disponível online em http://ssrn.com/abstract=996134 [consultado em 10/05/2025].
Devon E. Labat et al., “Improving juror assessments of forensic testimony and its effects on decision-making and evidence evaluation”, in Law and Human Behavior, vol. 47, n.º 5, 2023, pp. 566-578. Disponível online em https://doi.org/10.1037/lhb0000539 [consultado em 10/05/2025].
Figueiredo Dias, Direito Penal. Parte Geral, I, 3.ª ed., Coimbra, Gestlegal, 2019, p. 30.
Itiel E. Dror; David Charlton, “Why experts make errors”, in Journal of Forensic Identification, vol. 56, n.º 4, 2006, p. 600.
Itiel E. Dror et al., “Contextual information renders experts vulnerable to making erroneous identifications”, in Forensic Science International, vol. 156, 2006, pp. 74-76.
Hugo Luz dos Santos, “Processo Penal e Inteligência Artificial: Rumo a um Direito (Processual) Penal da Segurança Máxima?”, in Revista Brasileira de Direito Processual Penal, vol. 8, n.º 2, mai./ago. 2022, pp. 767-821.
Joanne Eastwood; Jeane Caldwell, “Educating jurors about forensic evidence: using an expert witness and judicial instructions to mitigate the impact of invalid forensic science testimony”, in Journal of Forensic Sciences, vol. 60, n.º 6, 2015, pp. 1523-1528. Disponível online em https://doi.org/10.1111/1556-4029.12832 [consultado em 10/05/2025].
João Henrique Gomes de Sousa, “A ‘perícia’ técnica ou científica revisitada numa visão prático-judicial”, in Julgar, Coimbra, n.º 15, 2011, pp. 27-52.
Jonathan J. Koehler, “The psychology of numbers in the courtroom: how to make DNA-match statistics seem impressive or insufficient”, in Southern California Law Review, vol. 74, 2000, pp. 1275-1305. Disponível online em https://silo.tips/download/the-psychology-of-numbers-in-the-courtroom-how-to-make-dna-match-statistics-seem [consultado em 10/05/2025].
Jonathan J. Koehler; Nancy J. Schweitzer; Michael J. Saks; Dawn E. McQuiston, “Science, technology, or the expert witness: what influences jurors’ judgments about forensic science testimony”, in Psychology, Public Policy, and Law, vol. 22, n.º 4, 2016, pp. 401-413. Disponível online em https://doi.org/10.1037/law0000103 [consultado em 10/05/2025].
Maria Clara Calheiros, Para uma teoria da prova, Coimbra, Coimbra editora, 2015.
Maria João Lourenço, Regime da Prova Pericial no Ordenamento Jurídico Português: Contributos para o seu aperfeiçoamento, Coimbra, Almedina, 2024.
Marina Gascón Abellán, Prueba Científica: un mapa de retos, Madrid, Marcial Pons, 2013, pp. 181-201.
Marina Gascón Abellán, “Conocimientos expertos y deferencia del juez (apunte para la superación de un problema)”, in DOXA: Cuadernos de Filosofía del Derecho, n.º 39, 2016, pp. 347-365. Disponível online em https://rua.ua.es/dspace/bitstream/10045/60169/6/Doxa_39_18.pdf [consultado em 10/05/2022].
Marina Gascón Abellán; José Juan Lucena Molina; Joaquín González Rodríguez, “Razones científico-jurídicas para valorar la prueba científica: una argumentación multidisciplinaria”, in Diario La Ley, n.º 7481, 2025, pp. 1-9. Disponível online em https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=3291545 [consultado em 23/02/2025].
Michael J. Saks; Dawn McQuiston, “The testimony of forensic identification science: what expert witnesses say and what factfinders hear”, in Law and Human Behavior, vol. 33, n.º 5, 2009, pp. 436-453. Disponível online em https://doi.org/10.1007/s10979-008-9169-1 [consultado em 10/05/2025].
National Research Council, Strengthening forensic science in the united states: a path forward, Washington, The National Academies Press, 2009. Disponível online em https://www.ojp.gov/pdffiles1/nij/grants/228091.pdf [consultado em 10/05/2025].
President’s Council of Advisors in Science and Technology, Forensic science in criminal courts: ensuring scientific validity of feature-comparison methods, Washington, D.C., Executive Office of the President, 2016. Disponível online em https://obamawhitehouse.archives.gov/sites/default/files/microsites/ostp/PCAST/pcast_forensic_science_report_final.pdf [consultado em 10/05/2025].
Samuel Gross, “Convicting the innocent”, in Annual Review of Law and Social Science, vol. 4, 2008, pp. 173-192. Disponível online em https://standdown.typepad.com/SCHOLARSHIP-AnnualReviewLawSocialScience-2008-Gross-ConvictingTheInnocent.pdf [consultado em 10/06/2022].
Samuel Gross; Jennifer L. Mnookin, “Expert information and expert evidence: a preliminary taxonomy”, in Seton Hall Law Review, vol. 34, n.º 1, 2003, pp. 141-189. Disponível online em https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=477202 [consultado em 10/05/2025].
Jennifer L. Mnookin, “Expert information and expert evidence: a preliminary taxonomy”, in Seton Hall Law Review, vol. 34, n.º 1, 2003, pp. 141-189. Disponível online em https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=477202 [consultado em 10/05/2025].
William C. Thompson; Edward Schumann, “Interpretation of statistical evidence in criminal trials: the prosecutor’s fallacy and the defense attorney’s fallacy”, in Law and Human Behavior, vol. 11, 1987, pp. 167-187. Disponível online em https://doi.org/10.1007/BF01044641 [consultado em 10/05/2025].
William W. Burke-White, “A Community of Courts: Towards a System of International Criminal law Enforcement”, in Michigan Journal of International Law, 24, 2002. Disponível online em https://repository.law.umich.edu/mjil/vol24/iss1/1/ [consultado em 13/12/2023].
Downloads
Publicado
Edição
Secção
Licença
Direitos de Autor (c) 2025 Maria João Lourenço

Este trabalho encontra-se publicado com a Licença Internacional Creative Commons Atribuição 4.0.